O filósofo e escritor Luiz Felipe Pondé disse na Folha de São Paulo em 01/08/16: “estou seguro de que, no futuro, olharão para nossa fé obsessiva na democracia como olhamos para os medievais e sua fé na leitura das vísceras de animais” e acrescenta: “rirão de nós por levarmos tão a sério a soberania popular”.
Trocado em miúdos foi o que escrevi, como menos talento que o Pondé, claro, há alguns dias neste mesmo espaço, sugerindo, na oportunidade, o urgente aprimoramento da democracia, convencido de que ela, como está, não tem condições de criar e manter o progresso.
Revigorado com a opinião do filósofo, proponho uma comparação da coisa pública com a empresa privada, mesmo sabendo que alguns leitores negarão a existência de relação entre uma e outra.
Mas garanto que tem tudo a ver, posto que administrar bem qualquer organização ( pública ou privada) passa necessariamente pelo bom gerenciamento do dinheiro, sem o qual nada funciona.
As empresas privadas escolhem as pessoas pela competência. Nenhuma organização prospera dirigida por bonzinhos ou simpáticos, mas sim escolhendo os melhores entre os sabidamente bons.
Aqui a simpatia conta pouco, embora ajude na escolha. Na vida pública, ao contrário, bastam abraços, sorrisos e discursos para ser escolhido pelo povo, independentemente da capacidade.
No mundo empresarial não existe (felizmente) eleição dos dirigentes, eles são escolhidos através dos currículos e da capacidade já demonstrada. São também valorizados pela experiência em outras organizações, que pode ser medida pelos resultados apresentados.
Estranhamente onde a responsabilidade é muito maior( setor público), não se exige nenhuma comprovação de capacidade ou de experiência de seus ocupantes. Basta mostrar simpatia e capacidade de falar aquilo que os eleitores querem ouvir.
Não acredito que essa “regra” de escolher os simpáticos no lugar dos competentes vá mudar um dia, se não mudarmos a democracia. A tal soberania popular que valoriza o bonzinho ignorando o competente, precisa ser urgentemente alterada.
A cidade prescinde de um prefeito com bom discurso, simpático com as velhinhas ou que agrade as crianças. Bastam honestidade, competência e dedicação.
Um dia, acredito, teremos outra forma de escolher nossos mandatários. Aí eles poderão ser bem remunerados como bons executivos, mas não precisarão de luxo, palácios, cadeiras de alto espaldar, púlpitos, batedores, seguranças, mordomias, rapapés, aplausos, homenagens e bajulação.
Sem empáfia andarão pela cidade, como um cidadão qualquer, sem aplausos, imprensa ou foguetório, cumprindo a obrigação de governar. Serão, agora sim, empregados do povo e poderão ser substituídos sem culpas ou traumas se não derem conta do recado. Além disso, como não houve ganhadores e perdedores, não haverá ressentidos torcendo pelo fracasso de quem está governando.
Não tenho a fórmula para a transição, nem sei quem faria a escolha dos melhores entre os candidatos a governantes, mas estou convencido de que nós, o povo, como a experiência tem demonstrado, não temos competência para escolher os dirigentes.
Renato de Paiva Pereira é empresário e escritor