O acordo que está sendo costurado entre o presidente, Michel Temer (PMDB), e os seus aliados no Congresso Nacional para livrá-lo de uma possível denúncia (por corrupção e organização criminosa), bem como, em contrapartida, para impedir que senadores e deputados sejam também cassados no futuro revela a face mais espúria daquela Casa de Leis, qual seja, assumir publicamente que se transformou de fato no maior balcão de negócios do país.
Caso a denúncia, que será feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), for autorizada pelo Congresso Nacional, Michel Temer pode virar réu e ser afastado. Isso porque o STF ficará autorizado a analisar o recebimento da denúncia. Então, se a corte aceitar abrir um processo, o presidente pode ser afastado de suas funções por até 180 dias. Porém, pelo andar da carruagem, isso dificilmente vai acontecer, pois Temer ainda tem apoio da maioria dos parlamentares.
Além da conduta desses “representantes” – que visam à satisfação de interesses, vantagens pessoais e partidários, em detrimento do bem comum – agora o toma lá, dá cá virou o alfabeto preferido ditado por Temer aos seus correligionários congressistas. Ou seja: cargos, favores, influências políticas em outros poderes e tudo o mais para garantir a sustentação do Governo frente ao desenrolar das investigações do Ministério Público Federal (MPF).
A Câmara dos Deputados já conta com 17 pedidos protocolados de impeachment contra o presidente Michel Temer. A última denúncia, inclusive, com pedido de afastamento definitivo do presidente, foi entregue à Câmara no ultimo dia 25 de maio pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Porém, o presidente do Parlamento Federal, Rodrigo Maia (DEM), sequer estipulou um prazo para avaliar a admissibilidade destes pedidos. Isso porque ele é um dos principais aliados de Temer na Câmara.
O PSDB que ao invés de optar pelo restabelecimento dos princípios da administração pública – estes, como apontam as investigações do MPF, supostamente violados pelo atual governo, sobretudo, no que tange a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a publicidade dos atos administrativos – preferiu continuar com os privilégios de quatro ministérios no Governo Federal, além é claro, de também tentar proteger o senador Aécio Neves (MG) de uma possível cassação no Senado.
Em tempo, o tucano foi flagrado negociando propina com Joesley Batista, dono da JBS, e conspirando para barrar a Operação Lava Jato.
Esse provérbio – de uma mão lava a outra, e ambas lavam o rosto dos políticos brasileiros – todo mundo já esperava da maioria dos congressistas. Porém, parece-me que o atual governo perdeu qualquer tipo de compostura e, diante de todos os fatos incriminadores, começou a jogar com as armas da tirania maquiavélica, como as ameaças veladas à Justiça e o discurso covarde de usar o medo da crise econômica para refrear a opinião pública.
A decisão de aliados de Temer de protocolar na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara um pedido de explicações do ministro Edson Fachin sobre sua relação com Ricardo Saud, lobista e delator da JBS, mesmo tal pedido sendo rejeitado por aquela comissão esta semana, foi recebida no STF como um sinal de guerra aberta… Uma tentativa notória de intimidação.
Não obstante a isso, no ultimo sábado, uma reportagem da revista “Veja” revelou que o governo teria utilizado a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) – o serviço secreto brasileiro – para investigar o relator da Lava Jato no STF, ministro Luiz Edson Fachin.
Publicamente, o presidente Michel Temer negou o fato, porém, mesmo assim, a ministra Cármen Lúcia, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e a Associação dos Juízes Federais do Brasil reagiram com indignação. Cármen Lúcia, por sua vez, afirmou que, caso se confirmada tal atitude, a investigação seria própria dos tempos das ditaduras.
Além disso, se não bastasse usar de todas as formas para criminalizar as manifestações populares, agora, diante da crise econômica que se arrasta há tempos, o governo vem sistematicamente tentando amedrontar o povo. Como se Temer e seus aliados no Congresso fossem a única salvação para o Brasil aprovar as reformas e assim, automaticamente, sair da crise gerando com isso “14 milhões de empregos do dia para noite”. Desmobilizar a opinião pública através do medo e da propaganda enganosa é típico de governos despóticos, que já não têm compromisso com a verdade e muito menos com a consciência de seus cidadãos.
A sociedade elegeu os representantes públicos no Poder Legislativo justamente para defender as causas dos cidadãos, bem como para fiscalizar o poder Executivo. Porém, na prática, aqui no Brasil, desde o início da República o que impera é o fisiologismo político escancarado em favor dos interesses particulares, entretanto, em desfavor da sociedade.
Contudo, os atuais congressistas não pretendem romper com o passado de imoralidade pública, vivenciado por aquela Casa de Leis, para trazer uma resposta de libertação democrática à Nação. Pelo visto, se Temer não renunciar e se agarrar ao poder a qualquer custo, e mesmo assim a sociedade continuar paralisada, apenas assistindo em casa a novela da Operação Lava Jato, essa oligarquia política vai fazer o que bem entender com o país até 2018.
Marcelo Ferraz é escritor e jornalista.