"> Corrupção na Seduc era ‘normal’, afirma empresário e delação – CanalMT
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Corrupção na Seduc era ‘normal’, afirma empresário e delação

Lázaro Thor Borges e Pablo Rodrigo

A corrupção na Secretaria de Educação de Mato Grosso (Seduc) era tão institucionalizada que acontecia como se fosse algo absolutamente normal. É assim que o delator Giovani Guizardi descreveu, com a frieza de detalhes, todo o esquema de cobrança de propina para acelerar pagamentos de obras de reforma e construção de escolas a empresários que tinham contrato firmado com o governo do Estado.

Em depoimento prestado na 7ª Vara Criminal que A Gazeta teve acesso, Guizardi contou à juíza Ana Cristina Mendes que os empresários já estavam acostumados a pagar propina para receber valores de contrato na Seduc. De tão comum, Guizardi não teve nenhum problema quando passou a fazer parte do esquema, depois de ser indicado por Alan Malouf.

“Infelizmente esta roda não foi inventada por nós, isso já estava funcionando, com o senhor Ricardo Sguarezi liderando isso. Os empresários estavam acostumados a pagar a propina e não tínhamos dificuldades nisso porque era um processo que já vinha andando, só foi substituída a figura do operador que antes era o Ricardo Sguarezi e passou a ser eu”, admitiu Guizardi, preso em maio de 2016 pela Operação Rêmora que desmantelou todo o esquema.

O empresário disse que soube da existência da organização criminosa e procurou Alan Malouf para entrar no esquema. A ideia, segundo ele, era recuperar os R$ 10 milhões investidos por Malouf na campanha do ex-governador Pedro Taques (PSDB). Ato contínuo, Malouf indicou Guizardi ao então secretário de Educação, Perminio Pinto, para que o empresário passasse a operacionalizar o esquema.

O esquema tinha uma característica interessante em comparação a outros que ocorreram em Mato Grosso. Não houve, conforme as investigações, dano ao erário, com desvio de dinheiro. A cobrança de propina servia justamente para acelerar os pagamentos, que já seriam feitos pela Seduc.

“O esquema ajudou muitos empresários”, revelou Guizardi. “Nós ficávamos muitos dias sem receber. Eu cheguei a ficar 90 dias sem receber, tinha muita gente no aperto”.

O delator também contou que se responsabilizou pela cobrança e pela divisão das propinas entre os políticos. Os valores arrecadados dos empresários eram divididos entre Perminio Pinto, Guilherme Maluf, Alan Malouf, Wander Luiz dos Reis, Fábio Frigeri e para o próprio Guizardi.

“Eu fui apresentado e isso foi tomando uma proporção que eu fui liderando. Poder não se dava, as coisas iam acontecendo e eu fui liderando, isso foi acontecendo de forma natural. Não fui nomeado, as coisas foram acontecendo naturalmente”, contou o delator, acrescentando que toda essa influência foi possível porque a indicação partiu de Alan Malouf, apontado como “a pessoa que elegeu Pedro Taques”.

O empresário, dono da Dínamo Construtora, alegou que, ao saber do esquema se incomodou com o fato de que havia gente participando da arrecadação de propina sem que tivesse ajudado na campanha do ex-governador Pedro Taques – o que, na avaliação do delator, revelava uma incongruência porque muitos dos que ajudaram a eleger o governador tucano, como o Alan Malouf, encontravam dificuldades para recuperar o dinheiro. “Em um primeiro momento isso era um meio de recuperar o dinheiro investido, isso foi visto porque nós chegamos lá e vimos que, quem não entrou com nada, estava recebendo e quem tinha financiado a campanha não tinha feito nada, não estava ganhando nada”.

Depoimento de Sguarezi
No mesmo depoimento, o empresário Ricardo Sguarezi, que tem um histórico de participação em esquemas na Seduc, afirmou que as fraudes nasceram para quitar dívidas da campanha com gráficas. A “dica” sobre o destino do dinheiro veio pela primeira vez depois de uma fala do servidor da Pasta, Fábio Frigeri.

“Em um primeiro momento, o Fábio falou que precisava pagar algumas dívidas de campanha. Gráficas que deveriam ser pagas. Ele nunca falou do Perminio e nem de ninguém acima dele. Ele falou que era para despesa de campanha eleitoral”, explicou o empresário, que firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal.

Sguarezi disse que chegou a perguntar a Guizardi qual seria o destino da propina cobrada, mas que a resposta foi sempre simplória, de que o dinheiro seria arrecadado para quitar as dívidas da campanha eleitoral de 2014. As propinas, segundo o delator, eram cobradas também anteriormente, ainda na gestão do governador Silval Barbosa.

“Eram outros contratos meus que eu tive em 2015, ano de 2014, 2013, 2012, época do Silval. Enfim contratos anteriores que também paguei propina. De contratos vigentes também tive que pagar propina. Não eram só os contratos que estavam sendo licitados”, garantiu Sguarezi.

O delator afirmou que imaginou-se que jamais haveria cobrança de propina no governo de Pedro Taques. Ele conta que nos três primeiros meses do governo os empresários não haviam recebido os pagamentos por obras em escolas. Ao procurar servidores da Seduc, Sguarezi soube que já havia o esquema de cobrança de propina para liberação de pagamentos.

“Depois que eu percebi que alguns empreiteiros já haviam recebido antes de mim foi o que eu decidi que deveria procurar o Perminio, para contar que havia propina sendo cobrada lá, ele se mostrou bastante surpreso e falou para mim não pagar, que aquilo não deveria estar acontecendo daquela forma”, afirmou o delator.

Sguarezi contou que Guizardi tina uma forma de cobrar propina bastante ríspida, com ligações constantes. Segundo ele, parecia sempre estranho que alguém que não era servidor da Seduc-MT cobrasse propina na secretaria. E, por conta disso, o empresário contou que preferia pagar os valores para Fábio Frigeri, servidor da pasta que ele descreve como “flexível”.

Operação Rêmora
Deflagrada em 2016, o alvo da Rêmora foi a Secretaria de Educação de MT onde, segundo o Ministério Público Estadual, havia um esquema de fraudes a licitações de obras e reformas de escolas, envolvendo um grupo de servidores, o ex-secretário Perminio Pinto, além de empresários. Conforme a denúncia, empreiteiros pagavam propina de 3% a 5% para poder participar de licitações orçadas em R$ 56 milhões e também receber pelas obras em Cuiabá e no interior.

Outro lado
Procurado pela reportagem, o hoje conselheiro do Tribunal de Contas (TCE) Guilherme Maluf disse por meio de sua assessoria que os delatores nunca apresentaram uma prova durante o processo e reafirma que não ‘participou nem autorizou qualquer pessoa a utilizar seu nome e sua posição política em qualquer ato ilícito no âmbito do Poder Público’.

O advogado de defesa do ex-governador Pedro Taques (PSDB), Emanuel Figueiredo, disse logo após o depoimento que ‘nenhuma prova trazida aos autos comprova isto’.

A defesa de Alan Malouf informa que ele continuará a colaborar com a justiça. O advogado de Perminio Pinto afirmou que ele não se manifestará sobre os últimos depoimentos.

Já as defesas Wander Luiz dos Reis e Fábio Frigeri não foram localizados para comentar e teor do depoimento.


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