Na decisão de 140 páginas que culminou na deflagração da Operação Esdras relacionada a suspeita de grampos telefônicos clandestinos em Mato Grosso, o desembargador Orlando Perri ressalta que o secretário de Justiça e Direitos Humanos, o coronel da Polícia Militar Airton Benedito Siqueira Júnior, atualmente preso preventivamente, recebia uma espécie de blindagem dos demais militares envolvidos no esquema.
A ideia do grupo seria preservá-lo para mantê-lo a frente de um cargo estratégico no governo do Estado e assim manter em plena atividade ações de interesse da organização criminosa.
“Parece, entretanto, que havia um propósito claro e inequívoco do grupo em não incriminar o Cel. Siqueira Júnior, que 17 deveria permanecer não apenas fora de qualquer investigação, mas em liberdade para que, como Secretário de Estado, homem forte do Governo pela importância da pasta que ocupa, ficar com as mãos livres para articular em nome e em favor da organização criminosa”, diz um dos trechos da decisão.
A decisão cita trechos do inquérito da Polícia Civil conduzido pela delegada Ana Cristina Feldner no qual em uma conversa telefônica autorizada pela Justiça um tenente coronel Soares disse que o simples indiciamento do coronel Siqueira no inquérito policial militar iria “fragilizar o grupo” e que a prisão dele “não poderia ocorrer de forma alguma”.
O ex-chefe da Casa Militar, Evandro Alexandre Lesco deu ordem ao tenente coronel Soares para impedir o indiciamento do secretário Airton Siqueira Júnior. “Faça o que tiver que ser feito, mas não deixe acontecer”, disse Lesco.
Na avaliação de Perri, estava claro o poder de influência do secretário Airton Siqueira Junior, pois até mesmo tenente coronel Soares, que não desempenha atividade jurídica, identificou elementos da participação dele. Por conta disso, criticou o Ministério Público por não denunciar Airton Siqueira na denúncia criminal encaminhada ao Tribunal de Justiça contra militares nos grampos clandestinos.
“Tão evidente foi a participação do Cel. PM Siqueira na organização criminosa que até o Ten.-Cel. Soares, iletrado no mundo jurídico, viu efetivos elementos da participação dele na organização criminosa. Todos viram elementos para o indiciamento e denúncia, inclusive o Cel. Catarino, Encarregado do IPM, que pediu ao Ten.-Cel. Soares que formalizasse uma representação pela prisão do Cel. PM Siqueira. Contudo, em razão da ordem enfática do coator Lesco, o coagido “enrolou” e fez o pedido cair no esquecimento. Todos viram, menos o Ministério Público”, afirma.
A decisão do desembargador ainda cita trechos de um áudio no qual o tenente coronel Soares e o coronel Lesco discutem informações a respeito do inquérito suplementar que aprofunda no recolhimento de provas para subsidiar o inquérito policial militar, Soares disse abertamente: “Ele (Cel. Siqueira) tem participação e por isso deve ficar… uma viagem muito psicodélica, né cara”, em referência ao deslocamento do Cel. Catarino para Rondonópolis, onde auscultaria vários policiais militares.