"> Acordos de leniência e seus aspectos controvertidos – CanalMT

Acordos de leniência e seus aspectos controvertidos

Com a recente decisão liminar do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (30/05/2017), ao acolher recurso da Advocacia-Geral da União e reformar decisão que havia desbloqueado os bens e o faturamento do grupo Odebrecht, envolvido na “lava jato,  novamente se publicizou a polêmica acerca da extensão/efeitos dos acordos de leniência e os entes competentes para realização de tal ato.

Apesar da vultuosa quantia estimada (R$ 8,5 bilhões) a que o grupo Odebrecht aceitou pagar, ainda não se tem como certa a segurança jurídica almejada com a realização do acordo. Isto posto, pretende-se, em uma breve análise, apresentar os principais pontos objetos de entrave entre os agentes estatais.

Inicialmente, se destaca a omissão, no tocante a Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) quanto a oportunidade de extensão dos benefícios da realização do acordo às pessoas físicas envolvidas no ato lesivo. Para a doutrina a inexistência de previsão legal deste benefício poderá comprometer a eficácia do instituto da leniência, eis que uma decisão em favor de delatar envolverá o risco de submeter à investigação criminal os integrantes da empresa que participaram do ato delatado.

Dessa forma, possivelmente, somente nos casos em que ocorra a mudança de gestores ou em que a conduta ilícita é isolada, o instituto será utilizado pelas pessoas jurídicas.[1]

Constata-se também como efeito da realização do acordo de leniência a interrupção do prazo prescricional dos atos lesivos previstos na Lei Anticorrupção. Entretanto, ainda que firmado o convênio, a pessoa jurídica continuará sujeita ás sanções previstas no artigo 19 da Lei Anticorrupção, assim como obrigada a reparar o prejuízo causado, conforme ocorre no caso recentemente analisado pelo TRF-4.

Levando-se a discussão para a seara criminal, a situação fica ainda mais complexa, uma vez que, teoricamente, os acordos de colaboração premiada e de leniência são firmados em esferas/matérias autônomas: a primeira segue os princípios do direito penal e processual penal; a segunda segue os princípios que regem a Administração Pública.

E é desta forma que surgem questões tão controversas, como no caso da JBS, em que a empresa – e toda a cadeia de produção – será prejudicada em virtude de atos criminosos cometidos por seus dirigentes, os quais já forneceram provas que poderão ser usadas contra a empresa em eventuais processos.

Assim, somente em havendo um maior debate sobre a regulamentação deste instrumento, aliados à sua aplicação, tornar-se-á mais segura a orientação das condutas e comportamentos das pessoas jurídicas interessadas em acordar com a Administração Pública, assim como sua utilização no âmbito interno estatal,[2] o que se procurou fazer através da Medida Provisória 703 – em que buscou dar melhores contornos ao instituto no âmbito da Lei Anticorrupção.

Ainda, neste ponto merece atenção a decisão  liminar no Mandado de Segurança (MS) 34031 do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,  em que após a discussão entre quem seriam os entes competentes para negociar a celebração do acordo de leniência, divergência entre a então CGU e o TCU, decidiu-se que o artigo 16, parágrafo 14, da Lei 12.846/2013, incluído pela Medida Provisória (MP) 703/2015, optou  somente pelo envio do acordo de leniência para o TCU após ele ser assinado., submetendo a uma condição de validação e não de negociação função esta a ser exercida pela então Controladoria Geral da União.

Fato é que, ao menos por ora, a decisão do TRF-4 apenas se trata de uma decisão liminar, e que ainda deverá ter seu mérito analisado pela 3ª Turma do tribunal.

Entretanto, além dos aspectos controvertidos apresentados acima, se acende um alerta em outras empresas que estão em processo de negociação da mesma natureza com a Procuradoria-Geral da República, como acontece com a JBS, [3] O cenário atual demanda cautela e estratégia, e as pessoas jurídicas que se atentarem a isto, poderão sair na frente.

Edgard Rocha é graduado em Direito pela Universidade Estadual de Londrina. Sócio do escritório “Cim, Rocha e Castella Advocacia”, com atuação em Direito Penal Econômico/Crimes contra a Administração Pública e Compliance.

Gabriel Castella é graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Sócio do escritório “Cim, Rocha e Castella Advocacia”, com atuação em Direito Administrativo/Relações Governamentais e Compliance.

 

[1]              BOTTINI, Pierpaolo Cruz Bottini. Direito de defesa.Novas reflexões sobre a lei de combate à corrupção. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-jan-28/direito-defesa-novas-reflexoes-lei-combate-corrupcao>. Acesso em: 04. Jun.2015.

[2]              GABARDO, Emerson; CASTELLA, Gabriel Morettini e. A nova lei anticorrupção e a importância do compliance para as empresas que se relacionam com a administração pública.A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 15, n. 60, p. 129-147, abr./jun. 2015.

[3] Disponível em: http://www.conjur.com.br/2017-mai-30/odebrecht-bens-bloqueados-mesmo-acordo-leniencia


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