"> Ano foi difícil, mas há esperança – CanalMT

Ano foi difícil, mas há esperança

Este 2016 ficará na lembrança como um ano de turbulências para o Brasil. Na economia, a crise se agravou de maneira significativa. Falou-se que as finanças do país estão gravemente enfermas, e a cura requer remédio amargo.

A terapia de choque que o governo está para aplicar ao “paciente” atinge a quase todos os brasileiros – são partes desse tratamento a fixação do teto para os gastos federais e a reforma da Previdência. Ninguém nega a necessidade de sanar as finanças públicas; o problema é determinar como serão feitos os cortes e a justa distribuição dos gastos.

A reforma da Previdência parece inquestionável para evitar a impossibilidade de honrar os compromissos com os aposentados, enfermos e outros assistidos. Também aqui, a questão é a distribuição equitativa de perdas e danos. Outra dificuldade é superar toda forma de corrupção na gestão do bem público.

Nem falemos das turbulências políticas! A presidente da República foi afastada; caiu o presidente da Câmara dos Deputados, por denúncias de corrupção; quase cai o presidente do Senado. Vários ministros de Estado foram afastados por denúncias de malversação do bem público; um ex-governador do Rio está preso e outros expoentes da política nacional são acusados de diversos crimes.

O ano político se conclui com ânimos sobressaltados e assombrados, diante dos anúncios de mais práticas ilícitas graves. Será este o ano da depuração na política brasileira?

Também vimos crescer a influência do Poder Judiciário; não há lembrança de precedentes similares. O procurador-geral da República e o Ministério Público têm agido com firmeza.

O Supremo Tribunal Federal está com mais trabalho do que nunca! Seu ativismo e protagonismo, quase sempre aplaudidos, por vezes parecem paradoxais, levando alguns a questionarem a eventual extrapolação de suas competências e a invasão do espaço do Legislativo.

É preciso reconhecer, porém, que, por força do Judiciário e de sua atuação, acontecem coisas inauditas nesta parte atlântica das Américas: denúncias e fatos de corrupção são seriamente investigados; altos diretores e executivos de empresas estatais e privadas são chamados às contas com a Justiça; pagam-se multas e outras penalizações, com somas antes inimagináveis, quando antes não se ouvia falar em devolução do bem público desviado ou roubado. Algo está mudando em nosso país tropical.

O ano também teve como marca gigantescas manifestações populares pelas ruas e praças de todo o Brasil. Em geral, não foram organizadas por partidos políticos ou sindicatos de categorias sociais: a voz das ruas apareceu e pretende ser ouvida.

Apesar de não ser sempre fácil compreender a linguagem dessas manifestações, elas deram expressão à consciência cidadã do povo brasileiro, que já não aceita mais o papel de mero expectador da cena política, sem influência nem participação. “Sua Excelência, o Povo” deseja usar a palavra e fazer valer a sua força, como apareceu claro nas eleições municipais de outubro.

O balanço geral do ano parece muito ruim, mas, a meu ver, não é tanto assim. Apesar de chegarem ao final do ano cansados de levar sustos, os brasileiros amadureceram no seu sentimento cidadão.

Os escândalos revelados, que parecem não ter fim, também podem ter o efeito de um choque ético para a consciência; tomara que apareça clara a percepção de que o “jeitinho” e a “lei da vantagem” não ficam bem, nem podem ser a referência maior nas relações sociais, econômicas e políticas. É preciso recuperar princípios e posturas éticas.

O cardeal dom Paulo Evaristo Arns, morto em 14 de dezembro, denunciou injustiças, violências e corrupção do poder enquanto foi arcebispo de São Paulo, mas nunca perdia a esperança de ver o Brasil curado de seus males: “coragem, não desanimem”, dizia ele.

Seu lema,”de esperança em esperança”, vale para desejar Feliz Natal e abençoado ano de 2017 a todos. Coragem, não desanimemos!

Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer, doutor em teologia pela Universidade Gregoriana (Roma), é arcebispo de São Paulo


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