O personagem desta crônica é um executivo aposentado que nos últimos dez anos fez planos de curtir a nova fase da vida sem horários e sem patrão. Como tinha um pé na roça, comprou uma chácara para plantar e criar animais.
Ele sabia que a produção em escala é fundamental para o sucesso de todo negócio. Claro que quem produz mil geladeiras por dia tem muito mais poder de fogo e mais lucro que o concorrente que fabrica cem.
O aposentado rural (chamemos assim o personagem), como não está em idade de assumir grandes riscos resolve adotar uma escala intermediária e apostar na diversificação.
A mulher está relutante em comprar a ideia, mas ele continua disposto. Prepara galpões, monta a irrigação, contrata pessoal, compra as ferramentas necessárias. Animado, adquire os primeiros animais: 5 porcas; 2 vacas, com cujo leite quer fazer queijo; 30 galinhas para produzir ovos e frangos. Também um cavalo e charrete para diversão dos netos.
Acha que em 60 dias terá alface pra vender e em 4 meses haverá uma fila na chácara para comprar os frangos caipiras que produzirá (isentos de agrotóxicos, conservantes ou produtos químicos).
Em alguns meses a realidade começa a se impor: as duas vacas que produziriam 30 litros de leite, estão feias, com pelo arrepiado e não dão nem 3 litros cada.
Passados 45 dias a alface (totalmente orgânica) está amarelada e raquítica e a bomba de irrigação já queimou duas vezes. Substituiu o caseiro preguiçoso por outro pior. Este último não resolve nada e vive ligando a qualquer hora ( a diversão dele é o celular) para informar que acabou a energia, a vaca escapou do pasto ou que precisa faltar 3 dias pra visitar a sogra.
Os custos com veterinário e medicamentos está ficando alto porque os leitões estão com diarreia, os pintinhos morrendo e as galinhas pararam de botar.
Quando os frangos ficam prontos, mais pela idade que pelo tamanho, começa a batalha pra vender: um amigo quer um mais paga 20 reais se for limpo e entregue na casa dele. O outro até compra dois, mas paga só 15. A mulher está brava porque não aguenta mais preparar os frangos que ele traz todo dia.
A essa altura ele já percebeu que vai acontecer o mesmo com os porcos. Também a alface vai ficar pronta para consumo ao mesmo tempo, e não sabe pra quem vender. Mas ele não pode abandonar este sonho. Quem sabe investir em frutas, legumes, criar peixes, codornas, abelhas?
Retomo aqui, meu caro leitor, que quer curtir a aposentadoria em uma bucólica chácara, a ideia de escala que comentei no começo. A única forma de uma chácara de aposentado dar pouco prejuízo é exagerar na escala…. pra baixo.
Acredite no conselho de quem já “fiz” isso: plante somente umas 20 sementes de alface por vez e regue manualmente. Compre no máximo 5 galinhas rústicas e esqueça de vacas e porcos. Plante algumas árvores frutíferas, de preferência as próprias da região. Ah! Nem pense em cavalo e charrete para distração dos netos. A internet ganha fácil esta disputa pela atenção deles.
Agora, se você insistir em produzir, é bom arrumar outro emprego para sustentar a chácara. Aí, mais tarde, com duas aposentadorias, quem sabe possa tentar de novo.
Renato de Paiva Pereira é empresário e escritor