Depois de alguns dias de escolas ocupadas também em Mato Grosso, e após ter lido alguns artigos sobre esse problema, entro na polêmica.
Dos artigos, selecionei três deles: o primeiro (Texto A – “Por que ocupamos escolas?”) é assinado pelo presidente da AME (Associação Mato-grossense dos Estudantes Secundaristas); o Texto B (“Por que não ocupar?”) é de um “professor e consultor legislativo do Núcleo Social da Assembleia Legislativa de Mato Grosso”; o Texto C (“Ocupação das escolas”) é de um “empresário e escritor de Cuiabá”.
O artigo do estudante, de chofre, declara que a AME está seguindo orientações da “Primavera Secundarista”, ou seja, uma “ação nacional desenvolvida pela UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), em defesa da Educação Pública, Gratuita e de Qualidade, através de ocupações de escolas”.
No mesmo artigo, é dito que em MT “a defesa da educação passa pela luta para barrar o processo de ‘terceirização’ (privatização disfarçada) das Escolas Estaduais e dos centros de formação e aperfeiçoamento profissional (Cefapros), através das chamadas Parcerias Público-Privadas”.
Os estudantes exigem ainda “o fim da corrupção na Secretaria de Educação”. Por isso, querem a instalação de uma CPI na Seduc.
Pois bem. Mesmo sabendo de problemas que os movimentos estudantis vivenciam, na condição de professor, além de cidadão que busca cultivar a consciência crítica, jamais eu me oporia a essa corajosa atitude dos estudantes.
Mais do que ocupar escolas, privatizar a Educação é inadmissível. Como diz um leitor, “toda vez que os governos terceirizam, privatizam, ou fazem PPPs, dão a si mesmos um Atestado de Incompetência Gerencial”. Inadmissível também é a corrupção no país.
Todavia, nada disso é consensual. Os referidos textos B e C são exemplos de dissenso.
Sem dó nem piedade, o professor e o escritor condenam as ocupações das escolas em MT. Sem se preocuparem com uma postura pedagógica, ambos agridem o discente articulista e descaracterizam a luta estudantil.
Os dois, por meio de seus discursos, tentam intimidar os jovens que estão dispostos a ver um país diferente desta derrota que estamos deixando a eles.
No processo de desqualificação do outro, o professor humilha o presidente da AME, apontando insistentemente seus “erros crassos de português”.
Todavia, em um insuficiente resumo, mesmo supondo esclarecer seus leitores, o professor apresenta “um breve histórico sobre a evolução do Estado, da Revolução Francesa (1789) até nossos dias”.
Ao cabo, fica a certeza de ser ele – o professor – alguém que absorveu a lógica das privatizações, o que contraria a essência da luta estudantil.
Mas se o professor não consegue valorizar a luta do outro, o dito escritor, por sua vez, achincalha os estudantes.
Faz denúncias vazias e toscas, como soe acontecer toda vez que adultos preconceituosos veem jovens reunidos.
Pior: afirma que “Os adolescentes não têm (sic.) condições de avaliar se o Estado deve ou não admitir parcerias privadas na manutenção das escolas”.
Claro que os adolescentes podem ter essa condição. Basta que tenham pela frente escritores qualificados e professores que, além de ensinarem seus conteúdos, estejam dispostos a vê-los como cidadãos críticos.
Isso cabe à escola, sim. Isso é dever do professor, sim. E no espaço do exercício da expressão crítica, toda forma de resistência tem valor.
Espero que as autoridades sejam capazes de dialogar com a juventude, que está ensinando a luta a muitos macacos velhos.
ROBERTO BOAVENTURA DA SILVA SÁ é professor de Literatura da UFMT e doutor em Jornalismo pela USP.
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