Tristes dias nos esperam. A incerta aceitação do processo de impeachment na câmara dos deputados não tem o condão de reverter de imediato as péssimas expectativas da sociedade brasileira e reiniciar o desenvolvimento.
A situação está insustentável. Temos uma presidente que não governa por falta de apoio político e popular e também porque não lhe sobra tempo para o exercício do mandato, pois as negociatas para manter-se no cargo exigem a no balcão do boteco, trocando apoio por um saco de farinha, uma bolsa de sal ou um garrafão de vinho.
As possibilidades futuras são sombrias: supondo que o impeachment passe na Câmara e seja admitido no Senado, a presidente será afastada por 6 meses, assumindo em seu lugar o vice Temer.
Como é uma situação transitória, nossas mazelas continuarão. Elevai tirar o pessoal do PT e colocar seus seguidores. A alteração provocará um grande transtorno administrativo até a adaptação dessa turma aos novos cargos.
Se passados os 180 dias o Senado não aprovar o afastamento definitivo da presidente, ela volta para o cargo e troca, de novo, o que foi trocado. Nesse caso, tudo piora porque o acirramento das divergências entre as facções políticas inviabilizarão o governo.
Se o Senado confirmar o impedimento, a oposição, encabeçada pelo PSDB, que lidera o movimento para o fim da Dilma, vai buscar a cabeça do Temer. O PT, juntamente com outros aliados, já se preparam para a futura vingança.
Para completar as mazelas, existe a possibilidade de o TSE cassar a chapa Dilma/Temer, passando o poder para o multidenunciado Eduardo Cunha.
Não há mais interesse em discutir se as tais pedaladas fiscais caracterizam crime de responsabilidade.
No caso da Dilma, isso já não importa, o fato é que elanão tem como continuar no governo, diante do ínfimo apoio político no Congresso e menos de 10% da população a favor.
A falta de capacidade administrativa, ausência de traquejo político e de humildade a levaram à ruína. Não adianta ela dizer que não cometeu nenhum desvio ético, as partes já tomaram posição e contra argumentos não prosperam os fatos.
O julgamento é político, só não sabemos quem vai ganhar. A única certeza é que o povo já perdeu.
Sobre a legitimidade do impeachment lembro a história do poeta Helvius Cinna. Durante os atos fúnebres de Júlio César assassinado em Roma, a multidão indignada caçava nas ruas os conspiradores para imediata decapitação.
Foi aí que prenderam o poeta Cinna, confundido com um homônimo conspirador. O preso explicava que não tinha nada a ver com a conspiração, pois era um simples poeta.
Não houve remédio, a turba gritava enfurecida enquanto o executava: “Se é poeta, que morra pelos seus maus versos”
Não sei se a Dilma é culpada pelas pedaladas ou não. Porém, se não sucumbir pela culpa real, poderá ser deposta pelos maus versos que escreveu.
Só nos sobra uma saída menos pior: convocar novas eleições. Mas, se nos livrarmos da Dilma, Temer e Cunha, aguardam-nos Marina, Bolsonaro ou Aécio.
O dilema dos antigos marinheiros volta a atormentar: escolher entre Cila (o mostro das tormentas) e Caríbdis (o implacável rochedo).
RENATO DE PAIVA PEREIRA é escritor e empresário em Cuiabá.